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Enquanto isso, na Sala de Justiça…

O mundo real está cada vez mais carregado de tragédias, caos e medo, com as notícias nos bombardeando 24 horas por dia. A violência, a corrupção, a crise ambiental e a insegurança são os vilões que parecem dominar nossa rotina.

Enquanto isso, o mundo fictício explode na tela com super-heróis, universos de fantasia e narrativas de “salvação”, como se a cultura pop estivesse nos oferecendo uma fuga ou uma esperança fabricada.
E é aí que está o desafio — nunca tivemos tantos vilões vivendo entre a gente, e, ao mesmo tempo, nunca vimos tantos heróis brilhando em filmes, séries e HQs. Parece até que, quanto pior a bagunça do lado de cá, mais heróis surgem do outro lado da tela, como se a solução fosse assistir, e não agir.
Estima-se que o universo Marvel possua mais de 50 mil personagens, entre heróis, anti-heróis e afins. Já a DC conta com cerca de 20 mil. Somando tudo, temos na ficção mais de 70 mil heróis — isso sem contar o Super-Herói Americano, Libélula, o Porco-Aranha e o eterno Chapolin Colorado.

Será que essa enxurrada de heróis no cinema não é só um jeito de anestesiar a gente? De nos convencer que, no final, o bem sempre vence — mesmo quando, aqui fora, o final está sempre aberto, incerto e, muitas vezes, sombrio?

Talvez a gente tenha terceirizado demais essa ideia de “salvar”. Passamos a esperar que personagens com capas, armaduras e poderes mágicos resolvam o que ninguém tem coragem de encarar de verdade. E isso virou um ciclo vicioso, acelerado pela internet, que faz a tragédia e o heroísmo fictício correrem lado a lado, alimentando um público sedento por entretenimento e esperança fácil.
Nunca tivemos tantos vilões no mundo real… e tantos heróis no mundo da ficção. Pena que um não consegue atravessar a tela pra encarar o outro.

Imagina só: o Homem-Aranha pegando o ladrão de celular antes dele piscar, o Thor controlando o clima maluco que deixa a cidade alagada, enquanto o Super-Homem se ocupa resolvendo os assuntos mais complicados do mundo. O Aquaman batalha para proteger as águas que ameaçam sumir do planeta e o Capitão América chegando com seu escudo e sua bandeira, pronto pra acabar com essas guerras e levantar a bandeira da justiça e da paz — porque, olha, no mundo real, a gente tá precisando disso mais do que nunca.

Já o Homem-Formiga? Ah, esse aí seria o herói irônico que se infiltraria nos cantinhos mais sombrios da corrupção, desvendando esquemas que ninguém vê, fazendo aquele faxinão que a política tanto precisa. O problema da Amazônia seria resolvido com o Pantera Negra, lutando contra o desmatamento e protegendo a floresta que o mundo insiste em esquecer enquanto olha pro próprio umbigo.

Mas o que a gente precisa mesmo são heróis do dia a dia — aqueles que enfrentam a bandidagem na esquina, que protegem as mulheres do feminicídio, que lutam para garantir uma vaga de emprego, que não deixam o trânsito virar zona de guerra e que se importam de verdade com o planeta que está queimando.

Só que, no mundo real, não tem ensaio, script, botão de pausa, nem portal mágico, nem armadura invencível. Quem dera tivesse um diretor dizendo: “Corta. Faz denovo!”. Tem é gente comum, com coragem e atitude, fazendo o possível pra segurar a barra.
Enquanto a gente se diverte com as aventuras na tela, o verdadeiro desafio é escrever um final decente pra essa história que está acontecendo bem aqui, do nosso lado.