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Extinção do ISS ameaça autonomia fiscal de municípios e exige reação imediata de gestores

Transição para o novo IBS pode comprometer orçamento de centenas de cidades catarinenses e impõe replanejamento urgente das finanças públicas

A aprovação da Reforma Tributária no Congresso Nacional acende um alerta vermelho para os municípios brasileiros. Um dos pontos mais sensíveis da proposta é a extinção do Imposto Sobre Serviços (ISS), tributo municipal que sustenta boa parte das finanças locais. Em seu lugar, entrará o Imposto sobre Bens e Serviços (IBS), de arrecadação nacional e repartido entre estados e municípios — uma mudança que compromete diretamente a autonomia fiscal dos gestores locais.

Para Felipe de Souza, advogado tributarista e membro do Núcleo de Direito Público do escritório Alencar e Martinazzo, o impacto será profundo. “Não se trata apenas de uma reforma. É uma ruptura. O ISS era a espinha dorsal da arrecadação de muitos municípios. Sua extinção exige uma nova postura técnica e administrativa urgente”, alerta.

A nova lógica de arrecadação será baseada no destino do consumo — e não mais no local da prestação dos serviços. Isso pode provocar perdas em cidades com forte setor de serviços, turismo ou indústria exportadora. Um estudo do IPEA estima que 124 dos 295 municípios catarinenses devem perder receita. A Confederação Nacional dos Municípios (CNM) aponta ainda que 13 deles devem crescer abaixo da inflação no período de transição.

A transição para o novo sistema será longa: entre 2026 e 2032, o ISS ainda coexistirá com o IBS, e a redistribuição integral das receitas só deve ocorrer até 2078. No entanto, o prazo não deve ser visto como folga. “Esse tempo é para se preparar. Quem não agir agora, corre o risco de ficar para trás já em 2026”, reforça Felipe.

Entre os principais desafios estão a reestruturação das leis orçamentárias, a adequação de contratos, a integração com o sistema de arrecadação nacional e a participação ativa na regulamentação do novo imposto, que será gerido por um Conselho Federativo — órgão que pode centralizar decisões antes tomadas localmente.

Além disso, a capacitação técnica das equipes municipais será essencial. Profissionais como tributaristas, contadores, procuradores e controladores internos precisarão estar prontos para lidar com as mudanças, fiscalizar os repasses e atuar estrategicamente. “Não basta entender a reforma. É preciso fazer parte dela”, diz Felipe.

Apesar da promessa do Governo Federal de criar um fundo de compensação para evitar perdas, a falta de regulamentação ainda gera incertezas. Felipe é direto: “Prefeitos não podem contar apenas com promessas. Esse fundo será um campo de disputa, e quem não estiver presente pode sair perdendo”.

Para o especialista, a reforma pode sim representar uma oportunidade — desde que os municípios se organizem. “Ela pode corrigir distorções e melhorar a justiça tributária. Mas sem preparo, pode virar um retrocesso”, conclui.

Mais do que uma questão técnica, a mudança afeta diretamente o futuro da gestão pública local. A capacidade de planejar, executar e entregar serviços à população está em jogo. A arrecadação é o combustível da máquina pública — e quem não se adaptar pode ficar à margem do novo modelo tributário brasileiro.