Quando Cinquenta Tons de Cinza (2011), de EL James, foi publicado, o mundo literário se viu em choque e fascínio. Inicialmente uma fanfic de Crepúsculo, uma trilogia se transformou em um interesse de vendas, tornando o BDSM, então até marginalizado na literatura comercial, um tema discutido nos lares e clubes de leitura ao redor do globo. Mas, o que faz esse livro ser algo tão atraente, e ao mesmo tempo gerar tantas discussões?
No centro da narrativa está Anastasia Steele, uma jovem inocente que se envolve com o magnata Christian Grey, um homem perturbado por seus próprios demônios e aficionado por um estilo de vida sexual dominador. O relacionamento deles é moldado pelo contrato de submissão que Christian tenta importar para Ana, e pela atração mútua que se desenvolve a despeito das complicações.
A maior crítica ao livro reside em sua escrita, considerada por muitos como simplória e repetitiva. EL James opta por uma narrativa em primeira pessoa, o que dá à protagonista Ana um tom ingênuo que beira o clichê. Suas reflexões internas são muitas vezes exaustivas e profundas, com expressões repetidas que não são relevantes para a evolução da personagem. O uso excessivo de frases como “minha deusa interior” torna a leitura enfadonha em certos momentos, e o diálogo pode soar artificial, especialmente nos momentos mais tensos do relacionamento entre Ana e Christian.
Por outro lado, a obra tem méritos no modo como conseguiu explorar um nicho pouco representado na ficção popular. Ao trazer o BDSM para o mainstream, ainda que de forma romanceada e muitas vezes estereotipada, James abriu portas para discussão sobre a diversidade sexual. No entanto, a retratação do relacionamento entre Christian e Ana declarou muitas bandeiras vermelhas quanto à noção de consentimento e abuso emocional, levando críticos a questionar se o livro realmente promove uma visão saudável sobre o poder nas relações íntimas. A fronteira entre um jogo consensual e um comportamento controlador é frequentemente borrada, o que incomoda muitos leitores que veem no romance um exemplo de romantização da toxicidade.
Ainda assim, é inegável que Cinquenta Tons de Cinza desempenhou um papel crucial ao expandir o alcance da literatura erótica, tornando o gênero mais aceitável e acessível a uma audiência geral. O sucesso da série gerou toda uma indústria de literatura erótica feminina, com livros incontáveis seguindo sua fórmula de poder, submissão e redenção emocional.
Se por um lado Cinquenta Tons de Cinza é limitado em termos literários, sua relevância cultural e impacto comercial são inegáveis. A obra não é um marco de qualidade, mas sim de acessibilidade e quebra de tabus. Leitores em busca de uma narrativa instigante e um desenvolvimento de personagens mais complexos podem se decepcionar, mas aqueles que buscam uma história envolvente com uma pitada de transgressão certamente entenderão o apelo. EL James não criou uma obra-prima literária, mas conseguiu capturar uma fantasia coletiva, e esse é o seu verdadeiro triunfo.